sexta-feira, 16 de março de 2012

O desespero


Amo as grandes malencolias, as insensesulidades metafísicas da inexistência. Amo a dor do não-sentir o colapso e a redundância da minha inorganidade que não me canso de elevar. Amo as esquivanças da alma, as fugas deste vago e inútil sopro de vida que me corre nas veias. Amo sacralizar as catacumbas de castelos conquistados pelos cruzados perdidos e errantes, enterrar-me ao seu lado, esquecer-me de me mim, sepultar-me-me em lugares esquecidos pelas memórias e deixar-me infiltar pelo gélido frio do tempo geológico.
Se algum dia tiver que explicar este sentir ficarei calado, a actividade cerebral cessará, o coração colapsará. Não transmitirei uma ideia, parmanecerei mudo, tronar-me-ei insensível, ninguém descortinará uma leve expressão nem no olhar, nem nos músculos faciais. Nenhum bafo ofuscará um espelho que me coloquem à frente da boca. Cerrarei os olhos, adquirei uma cor amarelenta, não verterei uma lágrima, converter-me-ei espontaneamente num espectro de morte. Sei que assustarei todos, mesmo aqueles que algum vez me amaram, mas juro não que não proferirei uma palavra, nem um murmúrio.
Os sinos soarão trinados silênciosos que abenço-o, as ladadínhas serão insignificantes, os ribeiros calar-se-ão, os montes transformar--se-ão em planícies e a escuridão finalmente será luz.

1 comentário:

José Rodrigues Dias disse...

Caro António Sá Gué:

Parabéns pela sessão.

É curioso que o título do meu texto poético de hoje, sábado, no blog "Traçados sobre nós", é: "Desesperando".

Um abraço,

J. Rodrigues Dias