domingo, 21 de junho de 2009

ETAPA - 0


Já cá estamos, pensei quando chegamos.
Tal como na vida, o caminho não se descreve, deve ser descoberto por quem o percorre. Essa era a minha posição no início, guardarei para mim aquilo que viver, pensava, mas as sensações foram tantas, as paisagens, os recantos, as Igrejas, as pedras milenares, os enigmas, o gozo de percorrer o caminho das estrelas, o rasto da via láctea, foi tão grande que não podia deixar de escrever algumas passagens. Aqui ficam.

Correu tudo como o planeado. Saímos do Porto pelas 4 horas da manhã chegamos pelas 15 horas a Saint Jean Pied de Port. Trata-se de uma pequena vila no país-basco francês, uma vila fronteiriça, encaixada nas altas montanhas matizadas de verde que constituem os Pirenéus, e que é preciso vencer no primeiro dia de viajem. Hoje sei que esta foi a mais dura das etapas.
As construções são de um basalto róseo, creio que é basalto, que lhe transmite uma aparência diferente do habitual, nomeadamente à sua Igreja, que fica encaixada no casario da principal rua, que corta o rio Nive através de uma pequena mas bela ponte, e é freneticamente povoada de peregrinos, de mochila às costas e bordão na mão, que a percorrem, de alto a baixo, à procura de um albergue que os possa alojar durante a noite, ou em busca de um último artigo que se torna necessário para a longa viajem que se propõem fazer. A Igreja em si é pequena, possui um abside muito simples, sem talha, nele ressaltam 3 figuras bíblicas, e uns resplandecentes vitrais, lá no alto, que representam santos que não consigo identificar, embora um deles diga tratar-se de S. Pedro. Notei uma outra particularidade, as arquivoltas do portal de entrada parecem não terem sido concluídas, ou seja, não acompanham o arco em todo o seu desenvolvimento.
Não inicie a viagem sem visitar a loja dos “Amigos do Caminho de Santiago”, além da simpatia, deram-nos informação que se revelou importante ao longo do caminho. Não é propriamente o Codex Calixtinius, que os tempos são outros (que teve a sua importância e, graças a ele, ainda hoje se percorre o mesmo caminho que os peregrinos da idade média percorreram), mas foi importante porque os perfis do terreno que nos forneceram antecipavam-nos, um pouco, as dificuldade que tínhamos pela frente, bem como da longa lista de albergues existentes ao longo do caminho acabou por nos facilitar na escolha dos locais onde se poderia pernoitar. Além disso, não se pode esquecer que a “Credencial de Peregrino” permite o acesso à rede de albergues.

2 comentários:

Wanda Wenceslau disse...

A busca do "caminho"
Qual será o caminho?
Quantas vezes não nos fazemos esta pergunta na vida?
As vezes a fazemos de uma outra maneira, mas querendo dizer exatamente isso: o que somos e para onde vamos?
O Caminho de Santiago é apenas uma rota. Mesmo que cada um tenha um diferente Caminho.
Acreditamos que estamos indo ao encontro de nosso espirito, d'alma e do corpo.
Será como uma auto-ajuda e do auto-conhecimento, da história, dos caminhos místicos e mágicos, mas também dos caminhos terrenos da aventura e dos desafios.
Eu imagino que algo sempre muda após essa aventura, mesmo que seja apenas o conhecimento de si e de mais nada.
Os outros continuam a nos ver igual que sempre, mas nós certamente nos veremos distintos.
Aqui no Brasil muita gente se empenha para essa viagem que custa caro , pois temos que nos deslocarmos de avião e ainda cumprir a parte terrestre e voltar via aérea ou maritima.Porém, mesmo assim o número de brasileiros que pretendem fazer essa viagem é enorme!
Espero também fazê-la, e que seja em breve , pois a idade e a saúde já não ajudam muito.
Um grande abraço!
Wanda

P.S. Como faço para obter seus livros aqui no Brasil?Tem como encomendá-los diretamente da editora?

António Sá Gué disse...

O caminho, de facto, não de deixa de ser mais uma rota que nos leva de um sítio para o outro, e poderá ser feito por todas essas razões que enunciou, no entanto, eu acredito que este é diferente: especialmente pela importância que teve e pelo legado que nos deixou (e não me refiro apenas ao aspecto religioso, porque há quem defenda que os povos proto-históricos já o faziam), nele, ao longo de todo o trajecto há sempre algo a descobrir. Não se trata apenas de um caminho escalvado sem nada de interessante para apreciar, bem pelo contrário. Acredito que quem o percorre, percorre-o sempre na busca de algo que perdeu, em busca de algo que ainda não encontrou.

P.S. Quanto há pegunta dos livros, digo-lhe que uma das editoras já não existe. Se for do seu interesse eu envio-lhos à cobrança. Contacte-me por e-mail.