segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Ano Novo



Rasguem calendários
Partam relógios
Apaguem o sol
Parem a Terra
Esvaziem o espaço
Que Tudo é Nada!

Não História
Não Memória

Na espiral do Silêncio
Retroceda o Tempo
Ao Zero Absoluto
Ao Ponto Nihil.
Que não posso viver mais
Com o peso do Foi atrás do É...

Assim o manda a terapia
Para esta minha Nostalgia:
Arda a mórbida Saudade
Na pira da Eternidade!


Autor: Henrique de Campos

domingo, 30 de dezembro de 2012

Cavalo de Troia



Não sei que sentimentos me conduzem nesta vacuidade em mim gerada. É como que uma espécie de inquietação morta, um abismo com vida, ou então, uma história sem memória. Serei culpado desta condição? Serei culpado desta indiferença dolorosa, desta lucidez indefinida, deste querer estar e não estar, de ser e não ser, desta vontade de não querer receber e de não querer dar? Serei culpado deste cavalo de Troia em mim gerado?
Que eu é este?
Não sei como cheguei aqui.

The Chieftains

sábado, 29 de dezembro de 2012

Alternância



Sou uma ficção. O cárcere de uma ideia e a abstracção de uma utopia. Sou o pavor de uma consciência e a humanidade de uma substância que orvalha. Sou o universo de uma criança e o horror de pertencer. Sou albergue de alguma luz e o pavor de um gládio. Sou girassol e uma coroa de espinhos. Sou montanha e vale, sol e satélite, ciclone e bonança, o eu e o outro... Sou sobras de um desejo.
Sou...

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Outra leitura



O vídeo anterior fui descobri-lo inadvertidamente. Este foi feito para publicitar a mesma obra. Talvez faça sentido incorporá-lo também.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Leituras

Jimi Hendrix




Hey Joe, where you goin' with that gun in your hand?
Hey Joe, I said where you goin' with that gun in your hand?
Alright. I'm goin down to shoot my old lady,
you know I caught her messin' 'round with another man.
Yeah,! I'm goin' down to shoot my old lady,
you know I caught her messin' 'round with another man.
Huh! And that ain't too cool

(...)


quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Às vezes penso no futuro...



Às vezes penso no meu futuro. Sei que será sempre uma incógnita, sei que não passa de um somatório de momentos inocentes, de decisões erráticas do passado, sei que nunca o conseguirei desvendar. Surge-me do nada, em momentos de lucidez, talvez, aparece em momentos de arrepio e silêncio, sempre impressos na tinta esvaecida da minha mente, moldado em sussuros de argila que não consigo tocar.
Às vezes penso no futuro e surge-me sempre o passado. Não aquele que não vivi. Esse não acredito nele! O passado que vivi mesmo sem ter vivido. O passado da felicidade ignorante de ser, o passado da ávida ansiedade do futuro, o passado da sã loucura de não conhecer.
Às vezes penso no futuro...

sábado, 22 de dezembro de 2012

A Amputação



Quando queremos pensar
e nos decapitam
Quando queremos fazer
e nos decepam
Quando queremos andar
e nos amputam
Quando queremos amar
e nos castram

O que há a fazer?

Troncos vegetais
sem cabeça nem membros.
Que nos resta?
Que nos resta?

Já nem morrer podemos
porque de facto já morremos

In: rio da morte
de Henrique de Campos

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Aventurei-me...



Aventurei-me e mitfiquei-me.
Corro neste canal do tempo que eu próprio criei mas, sei hoje, que o mesmo não me pertence. Percorri, involuntariamente, os rios finitos da memória mas tornaram-se infinitos. Procurei magia nas palavras e enfeiticei-me no nevoeiro da minha noite.
Parece que tudo se passa nas costas do espelho, sem que consiga perceber. Reflecti-me à procura do destino e enfeiticei-me pelo precipício do futuro. Olhei-me na busca do irreal e toquei a realidade. Procurei o futuro e misturou-se-me com o passado. Encostei-me na cadeira e encontrei o desassossego.
Resta-me o mistério do sonho.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Supertramp



(...)

After School is over you're playing in the park
Don't be out too late, don't let it get too dark
They tell you not to hang around and learn what life's about
And grow up just like them - won't you let it work it out
- and you're full of doubt

(...)

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Realidade em chamas




Não conheço a autora desta obra. Quando a li pela 1.ª vez, já lá vão uns meses, fiquei com a impressão que se trataria de alguém com um fascínio supremo pelo imaginário, alguém que possui o dom de se assenhorear, com facilidade, da nossa sensibilidade, de nos tocar com as palavras que usa. Tudo isto mantenho. Perante esta constatação a imagem mental que construí dela foi de alguém a entrar na casa dos “entas”, adulta, portanto. Enganei-me redondamente! É uma jovem a quem antevejo um grande futuro, enquanto autora, caso consiga furar os valores deste nosso tempo.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Em busca de uma verdade

(...)

Procuro-te,
em mim e nos outros,
na imanência dos símbolos,
na irrealidade do real,
no Tudo, e no Nada,
na razão das próprias causas.

Sei-me estrangeiro em muitos mundos
mas quero-te,
verdade estéril.

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Talvez! Fonte de inspiração

O que há em mim são encruzilhadas. Em mim só vejo indefinições de vésperas do passado e de antecipações do futuro. O que há em mim é um tédio indefinido e incompreensível. Isto nada explica, sei disso. Não me explica, eu sei. Explicará se disser que são vestígios de um tempo que não existiu.Talvez! Explicará se disser que todos os dias me perco em sonhos. Talvez! Explicará se admitir que sou um cego dissociado do real. Talvez! Explicará se concluir que não sei quem sou. Talvez! Que mergulho nas emoções e que me ficciono diariamente. Talvez!

domingo, 25 de novembro de 2012

Lou Reed



(...)

Little Joe never once gave it away
Everybody had to pay and pay
A hussle here and a hussle there
New York City's the place where they said, Hey babe
Take a walk on the wild side
I said, Hey Joe
Take a walk on the wild side

(...)

sábado, 24 de novembro de 2012

As palavras




As palavras são agridoces, consomem-nos, são um sossego desassossegante.
As palavras servem-se em pratos de silêncio. Perseguem-se. Perseguem-se nas sombras dos mundos, nos labirintos de nós, nas pedras da memória, no escuro da inconsciência... e calam-
-se. Calam-se na vontade de falar, na compreensão das incompreensões, no epitélio dos sentires... mas escrevem-se. Escrevem-se para rasgar tristezas e dores, reprimir injustiças e atingir utopias.
As palavras justificam-se apenas para dizer tudo do nada e contrair a narrativa.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Consciência



A consciência do mistério das coisas chega a ofender e horrorizar. Esta ignorância de mim, a minha ignorância e a dos outros leva-me em viagens de pálidas sombras de ser. Apavora-me esta cadeia que liberta e oprime simultaneamente. Peregrino nela longas horas, movimento o tempo, fito-me e fito o olhar dos outros, ando a monte em busca de portas e encontro sempre arquétipos sagrados herdados, esperanças desarrumadas, sombras minhas e dos outros, sombras das sombras, sempre o mesmo sem-fim de razões que mal sei se existem.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Edelweiss



Hoje, o fluxo da mente vem-me da efemeridade dos sons, dos violinos, dos violoncelos... Vem-me das imagens de verde pacífico, da orografia dos montes onde nasce o arco-íris. Clarões de lua mandam-me lembranças de contos esquecidos, de sóis distantes, de sonhos vagabundos aveludados pela luz das montanhas.
Hoje, e sempre, o refluxo da mente vem-me da profundidade das ideias, do oceano de horas interrogativas, do vento frio que nasce nos píncaros da consciência, percorre as dobras do sentir e eleva o mundo a um estado catatónico, insano, repleto de mistérios.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Réplicas



Realidade ou sonho? Dúvida ou certeza? Não interessa! Não vão além de meras aproximações do talvez! Talvez é tudo quando se sonham visões e utopias e se querem vivê-las como verdades. Talvez tudo seja acordar com as ondas de um vulcão e adormecer nas réplicas do torpor do sentir. Talvez nada seja a inconsciência de ser e viver na analgesia da existência exterior. Talvez nada seja o infinito da noite. Talvez tudo seja desconhecer as dimensões da alma humana e querer mensurá-la.
Talvez nada seja ter certezas do nada.
Talvez tudo seja sentir aproximar o sono e não querer dormir.

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Águas de um rio



As águas deste rio vazio engrossam com trovoadas da ilusão e metáforas. Volta a encher-se de tédios, enganos e verdades incompreensíveis. Enche-se de interstícios abismais que se adernam alternadamente num tempo que não existe. Que temores, que mal-
-estar é este, que é nada, mas que sufoca e a psicologia não teoriza? Quem se importa? Quem sabe?

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Quebrar os ontens



Hoje não quero olhar para trás, quero deixar as falsas ilusões e, amanhã, quero limpar as lágrimas secas que me encharcaram ontem.
Hoje, sem razão aparente, vejo uma luz no deserto de amanhã. Amanhã quero ser eu a fazer as regras, a quebrar os ontens que todos os dias são misteriosamente hoje. Quero virar a página, iniciar um novo ontem, mesmo na véspera de manhã. Amanhã quero partir, quero partir para longe de mim, não quero conhecer a realidade palpável de ontem nem entrar nas brumas reais do hoje.
Amanhã não quero pensar no ontem de hoje, nem no ontem de amanhã.

terça-feira, 30 de outubro de 2012

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

OS ISIDROS – A epopeia de uma família de cristãos-novos de Torre de Moncorvo

A alma é também um abismo temporal e ainda bem. A minha é medieva, sei-o agora. Gosta de viajar nas dimensões do passado, de reconhecer as pessoas que existem nas páginas dos livros e captar-
-lhes a tristeza inenarrável sentida nas acusações mesquinhas e interesseiras feitas em nome de uma verdade insincera.
Gosta de se transformar nas suas vidas quotidianas, de as sentir percorrer as ruas que também percorre, de as olhar nos olhos e descortinar neles a força e a esperança para enfrentar os murmúrios acusatórios dos vizinhos e dos amigos. Gosta de conhecer a realidade prismática que foram obrigados a viver e que transformaram em defesa da sua verdade.
Sente que lhes pertence. Sente que tem dentro dela o verbo das orações, os sonhos inacabados antes de tempo, a calma de quem tem a consciência tranquila e nada tem que temer.
Este não é apenas um livro de pesquiza histórica, de perseguição e de intolerância. Ultrapassa a narrativa fria da ciência e vai-nos dando quadros de um quotidiano que nos ajuda a compreender as emoções, os sentimentos e as posições de quem não se verga e morre na fogueira, de quem não resiste à dor e é obrigado a renegar as crenças do amanhã.

Lançamento: Ver aqui.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Trilogia



Lágrimas secas, duras como a razão, brotam da confusão do pensamento, dos dias nunca vividos, das noites congeladas de infância.
Flores de ilusão vão nascendo entre calhaus arredondados pela aspereza das conclusões, pelos sorrisos incompreendidos, pelas duas faces de Janus.
Mentiras de alegria nascem de dentro para fora, tropeçam em soluços de tristeza, correm em trilhos cruéis só visíveis à luz da noite.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Estalactites




Precipita-se o carbonato de cálcio, o absurdo, substância terrível de todas as horas. Cresce a estalactite da existência, gota a gota, pingo a pingo, cresce a desilusão, cresce a fenda de tudo relacionar.
Não pares, continua a crescer para baixo fórmula primitiva de ter. Não pares, precipita-te até tocares o mundo, até romperes o véu do entendimento.
Cresce, cresce abismo de ser, espuma, perde-te, vence-te, cansa-te, quebra o equilíbrio gravítico de forças que se adensam e se embaraçam num tecto dormente, artificial, sem tempo nem sonho.

domingo, 21 de outubro de 2012

sábado, 20 de outubro de 2012

Arquiteturas




É um condenado à deriva. Gosta de caminhar sozinho e rápido, provavelmente, na tentativa de se encontrar mas, por razões que desconhece, chega sempre atrasado. Verga-se aos medos acumulados, relaciona o passado sempre em silêncio, repisa a lava que dele brota mas as palavras saem-lhe sempre desconexas, maleáveis, sem a razão de ciência. Tudo lhe é estranho. Alegrias de sociabilidade, dispensa-as. Grinaldas de vaidade liberta-as no mar de confiança pelos outros, não nele. Nele, encurrala as nuvens silenciosas, os ventos tempestuosos, o sol de sentires...
Ele é um condenado às galés. Veleja entre o real e o irreal e não sabe distinguir a diferença. Desfralda as velas para escutar os sussurros de estátuas imortais, as cores, as formas, mas tudo são mistérios do horrível.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

O arco-íris



Levantou-se e seguiu o caminho de ontem. Não via alternativas, nem bifurcações por onde caminhar. Tudo lhe surgia claro. O caminho de ontem é aquele que agora trilha. O caminho de hoje será o caminho de amanhã. Foi com esta verdade banal a encharcar-lhe a cabeça que chegou ao rio dos sonhos. Agarrou as estrelas, escutou as ninfas das águas, olhou o céu azul e viu o arco-íris reflectido nas árvores. Decide segui-lo. Andou, correu, subiu e desceu montes... crente que conseguiria tocá-lo. Cansado, descrente, exangue pelo esforço, parou.
Sentou-se no banco do pensamento e esperou que o tédio desaparecesse.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Visão sem alternativa



Descia da montanha. Sentou-se na encosta íngreme e olhou o além-
-de-si sem esperança. Percorreu o vale, perscrutou a encosta fronteira e procurou o sentido do rio. Seguiu-o com o olhar. Sentiu-
-lhe a força do momento e deixou-se ir no silêncio das estações. Navegou em torno da história, andou às voltas na memória e esgotou-se para tocar as extremidades. Tentou voar mas a frialdade que o percorria impedia-o de ascender nas asas das correntes quentes. Desistiu! O vento glacial que agora soprava e as risadas das promessas nunca cumpridas nebulavam-lhe a mente. Tanta gente! Tanta luz suave.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Johnny Cash



I hurt myself today,
To see if I still feel,
I focus on the pain,
The only thing that's real

(...)

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Está escrito nos livros


Está escrito nos livros
As verdades são simples

O gelo derrete
As memórias não

Os pássaros voam
O pensamento corrói

O sonho existe
fica entre a madrugada e o nada

Os lobos não fogem
combatem o passado

O silêncio incomoda
E não entendo o porquê

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Não me perguntes

Não me perguntes. Eu já naveguei no mundo, mas nada sei. Eu sou a ilha inabitada, a dobra tectónica de placas inexistentes, a nuvem passageira disforme e inconsequente.
Não me perguntes nada. Não precisas de acreditar em ninguém, está tudo dentro de ti. Sê tu! Segue-te!
Não me sigas. Eu não existo. Eu sou uma sombra de mim, a máscara de carnaval imprudente onde soam razões de uma ciência sem respostas. Não me sigas. Eu sou a esquina sem esquadria de uma tarde longínqua, um momento impresso na distância da noite.
Não digas nada. A vida é uma fantasia: segue-a.
Eu estou perdido... Dá-me a tua mão.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Fechadura

Creio na individualidade...
Nela giro
Nela caio com vertigens
Nela me perco
E recomeço todos os dias

Creio na individualidade...
No volante dos meus sonhos
A risca no céu que me liberta e me assombra

Creio na individualidade...
Nela sintonizo os acordes da música que ouço
Nela pinto as paisagens irreais

Creio na individualidade...
Nela gravo símbolos que não conheço
E pedaços do amanhã

Creio na guardiã do segredo “conhecer”

Neil Young

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Cinzas tétricas

As emoções revelam-lhe tristes restos em agonia. O professor insano, de métodos pouco convencionais, jaz pregado no corredor do tempo. Um silêncio de lua cheia trespassa-lhe o peito. Tédios, em estratégia de aranha, espreitam na sombra do pensamento. Morre! Morre pregado nos sonhos de menino que, num ato de benevolência, ainda lhe seguram o coração.
Já não vê os olhos que foram dele. Quase não escuta os lábios de infância que lhe iluminavam as vésperas de um mundo numinoso. Já não sente a alegria de tardes soalheirosas. As emoções dos encantos esvaecem-se... Nada acontece, nem um sinal de resistência.
Finalmente o congelamento.

domingo, 30 de setembro de 2012

A génese

Larga o escudo da realidade e olha para dentro. O que vês? O que ouves? Um oceano de vulcões insensatos que te ferem e reprimem. Rugidos de bestas que se digladiam em silêncio. Lava incandescente que te deixa em carne viva. Placas em movimento que se empurram sem razão, que se elevam e se afundam criando montanhas. Vês planícies que te acalmam?! Ouves o som do vento a romper a aurora?!
Esse é o dia da encarnação.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Interrogações

Pensar! Fundir a realidade na fornalha humana. Viajar na história e nos céus, misturar cores e sons, abrir fendas, lamber feridas, deificar o compreensível e o incompreensível, implodir vulcões... Até onde é possível navegar? A que temperatura se separa o ferro da ganga? Que profundidade é possível atingir neste poço de escuridão e luz? Que mundos de amor e ódio se tornam realidade neste caleidoscópio estático em perpétuo movimento? Que sonhos e realidades se sonham? Qual a sua energia cinética? É possível pensar não pensar? Como se trava esta máquina de complexas engrenagens?

terça-feira, 25 de setembro de 2012

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

A erosão do tempo

A erosão do tempo revela-me. Revela-se-me na carne, nas rugas, nas cachoeiras das memórias, na cara contraída que vejo ao espelho. Sei-me moribundo, penitente do tempo, carregado de um pó pegajoso que não consigo sacudir, que me mantém rastejante de um tempo que respiro em silêncio.
Sei que na pergunta tensa de hoje fui a resposta relaxada de ontem. Hoje, sei que no Caminho do Presente fui a Ponte das Despedidas Forçadas que ontem atravessei. Sei! Sei-me caminhante mutante, abrigado das emoções, que avança em direção à Liberdade e sempre refazendo o tempo.

sábado, 22 de setembro de 2012

Aventurei-me!

Aventurei-me! Ousei entrar na busca reveladora da beleza. Descobri montes verdejantes, melodias, flores em permanente abertura, carícias infinitas... mil feitiços que só a realidade criativa nos revela.
Aventurei-me! Quis saber como tudo começou. Descobri corredores de tempo, memórias reveladas, desejos, fontes secas, nevoeiros, ansiedades, frustrações... tudo símbolos de uma matriz humana comum.
Aventurei-me! Quis saber o que era a vida, quis penetrar nos enigmas da ciência reveladora das verdades simples e complexas. Descobri a eterna luta entre Deus e o Diabo.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Escrever (parte 2)

Escrever é ser capaz de detetar esses leves momentos impressivos que todos nós possuímos e conseguir colocá-lo nas palavras. Escrever é entrar na nossa escuridão e nela conseguir descortinar a mais leve fímbria de luz. Talvez eu seja um impressionista, talvez me interessem muito mais as cores interiores do ser humano, mesmo que sejam em tons negros, que o cinzentismo da realidade. Talvez me interesse mais o movimento do pensamento que o quietismo marchante e alinhado das palavras. Talvez me interessem mais as palavras perfurantes, que abrem brechas em nós, do que as ideias românticas e amenas que se me revelam pelas manhãs.
Escrever é para mim, e cada vez mais, afogar-me conscientemente no oceano do pensamento, procurar sentido nas sombras sem sol, juntar os cacos escondidos e partir em busca do tesouro perdido no templo humano.
Escrever é tentar definir o nada, que é tudo, para parafrasear o poeta.

Mozart

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Escrever (Parte 1)

Escrever sem sentir o mundo é apenas descrever. Não me revejo na escrita meramente descritiva, por muito escorreita que seja do ponto de vista gramatical ou sintático. Escrever sem tentar colocar nas palavras a individualidade do mundo interior que todos nós possuímos, vivido de forma mais ou menos intensa, pouco mais é do que um ato de aprendizagem que se treina na leitura e no próprio ato de escrever.
Se há alguma beleza na literatura, essa beleza passa, no meu modesto critério, pela capacidade de reinventar o mundo que está à nossa volta, que todos nós vemos, mas que todos sentimos de forma diferente. Acredito que essa capacidade de reinventar o mundo não depende apenas do conhecimento científico que se possua. Não rejeito que esse conhecimento nos facilita a tarefa, mas, para além desse conhecimento científico, existe um outro muito mais humano, e que é também conhecimento, sem qualquer sombra de dúvida, e que passa pela tomada de consciência de nós e do mundo que nos rodeia e que, creio, pode existir no mais humilde dos seres humanos, mesmo que não possua vocabulário capaz para expressar o que vai no seu íntimo.

(Continua..)

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Envelhecer


Resolver esta minha inquietação, que mais parece genética, hoje, parece-me impossível. Envelheço nestas cavalgadas, nestas engrenagens de pensamentos imbricados uns nos outros, nestes raciocínios que creio fazerem sentido para tentar encontrar o valor de “x”, como se tudo fosse lógica matemática, sabendo bem que não é.
Envelheço à procura daquilo que fui e não fui, em busca daquilo que não sou e gostava de ter sido, sabendo que é impossível e não importa nada.
Envelheço neste verbalismo metafísico, crente que só ele me conduzirá à placidez do horizonte sem memória e que hoje não me enche de tédio. Envelheço a aproveitar o tempo, a olhar para mim, a esquecer o amanhã, a destapar a tampa que permanece sobre pressão diária, sabendo que esta pressão é, simplesmente, inerência da condição humana.
Envelheço a olhar permanentemente o calendário sem nunca fixar o dia, a olhar o relógio sem nunca querer saber as horas.
Envelheço à procura da razão sem nunca a querer ter, a ruminar ideias, a caminhar no descaminho do absurdo.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Abismo orgânico


Há dias em que tudo me parece alegre, hoje, e desconheço o motivo, a alma entranhou-se no corpo e parece não querer sair. Hoje, o abismo é gigeriano, parece ser muito mais orgânico que existencial. Descarregou no fígado, fixou-se no estômago e parece querer tomar de assalto todos os músculos. Pigmeu, medievo, são adjectivos que me servem neste momento. Hoje não penso nem sinto, desdenho. Desdenho da existência, da criatividade que me parece desconexa, desdenho do relógio que não pára, dos entreténs estéreis...

Patti Smith

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Requiem

O que ficou deste dia? Vagos pensamentos. Fundições arrepiantes de sonho e realidade, tropeções na geografia da consciência de ser. Banalidades! Leves possibilidades da existência de um mar, certezas da existência de grandes e fortes portões de ferro. Conversas com sombras, visões fantasmagóricas induzidas pelo cansaço, alheamentos, passeios na falsa orografia que esta parede branca possui, emoções levitantes que as palavras arrastam.
Nada!
Inutilidades. Perdas de tempo, negações de um canto, mero requiem às ruínas de um templo absurdo.

sábado, 15 de setembro de 2012

A trincheira de mim

Apaga a luz. Deixa vir a noite mais cedo. Aqui, na trincheira, o tempo não me descobre. Aqui não há princípio nem fim, nem céu nem inferno, apenas sonhos. Sonhos infinitos que o sol desfaz.
Apaga a luz. A noite pertence-nos. Aqui sinto-me protegido de mim e do mundo. Deixa-me sossegar sobre o teu peito, aqui sei que me encontro, sei que um dia verei a razão de querer.
Apaga a luz. Aqui não oiço passos no soalho, nem ventos enigmáticos nas copas das árvores. Aqui não há ecos da infância, apenas tormentas que me comovem.
Apaga a luz...

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Sei! Mas...


Sei que as palavras leva-as o vento, mas falo.
Sei que o amanhã não existe, mas espero por ele.
Sei que não consigo, mas tento.
Sei quem me roubou a alma, mas perdoo-lhe.

Vou!

Sinto-me perdido nas circunstâncias, mas vou.

King Crimson

terça-feira, 11 de setembro de 2012

A rotunda das palavras

Hoje, quero crer que há um caminho para a solidão. Não sei se lhe chame caminho se rotunda. Talvez se aproprie esse conceito. Chamar-lhe-ia a rotunda das palavras, especialmente daquelas que nos obrigam a andar em redor de um conceito para nos fazermos entender e nunca se chega a uma definição concreta e definida.
Estudam-se os conceitos filosóficos, lêem-se os últimos avanços da química quântica, mas subsiste sempre esta sensação interior de vazio, esta sensação de não nos reconhecermos ao espelho. Os conceitos de lógica matemática desaparecem, as montanhas caem-
-nos em cima, a luz adensa-se em nós, o tempo traz-nos reflexões que não cabem nos cânones da ciência e o caminho vai-se transformando em rotunda. Apetece desistir, não adianta procurar perece ser a conclusão. Mas, como se quebra este tráfego de pensamentos banalmente sinistros? Como se deixa de ouvir o eco do tempo? Como se busca a felicidade nos interstícios do nada?

sábado, 8 de setembro de 2012

Nota de rodapé

Cruzo-me nas formas da noite. Percorro as ruas desertas, alucino, os nervos polarizam-se, o sangue fermenta, sufoco, a escotilha abre-se automaticamente: abre-se-me o futuro. Vejo claro. Há um fantasma de um tempo inexistente que o percorre, uma fantasia de um espaço unidimensional que se supõe permanentemente.
A noite é bela. É feita de sonhos e sombras, matéria-prima de um naufrago no oceano do nada. A noite prende-me ao cordão da vida, nela encontro os vales abissais de onde vim e as planícies serenas para onde quero ir.
Na ausência da noite floresço. Ela é o laço que me ata, nela encontro a razão de estar aqui.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Mudanças

O que aconteceu a esta música?! Deixei de gostar dela... Que mudanças aconteceram em mim? Que feitiço deixou de ter? Os sons e as palavras não mudaram. Que raízes se desprenderam? Não sei! A magia parece ter desaparecido.
Durante breves instantes os céus do futuro enchiam-se de promessas, nela fundiam-se os tempos, parecia perseguir o arco-íris, respirava esperança, mostrava razões... de repente, transformou-se.
Agora, é uma flor sem vida, é uma simples memória desarticulada, uma luz sem brilho. A voz é roufenha, as palavras desconexaram-se da sua simbologia, tudo me parece diferente e banal.
Agora, os sons já não são inspiradores de emoções, nada revelam, nem noções transmitem, agora, não passam de meras ondas acústicas que se propagam no ar.
O que aconteceu a esta música?

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Fugas


Há alvoroço em mim. Há fugas para aquilo que fui, para o pó dos caminhos que pisei. Há vozes que me chamam, pensamentos que me fazem olhar para nascente de mim. É como se se soltassem vadiamente, se libertassem das amarras do dia. É sempre assim! As ilusões parecem brilhar mais com a noite. As névoas dissipam-se, as estrelas soltam-se dos olhos para fora, os candeeiros transformam-se em sóis, o céu em inferno e o sonho em realidade.
É sempre assim! É um perpétuo movimento. Sempre de dentro para fora, sempre de dentro para fora, sempre de dentro para fora...

Rick Wakeman

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Delirium


Há guerras que gritam
E outras que silenciam
Há silêncios que destroem
E outros que questionam
Há gritos silenciosos
E outros de revolta
Há angústias que se calam
e palavras que angustiam
Há correntes que libertam
E outras que ofendem
Há bandeiras com glória
E glórias sem bandeiras
Há delírios sem razão
E razões delirantes
Há reações sem movimento
E movimentos sem ação
Há pressões sem pressão
E opressões sem armas
Há espíritos que se moldam
E outros que renunciam
Há vidas pacíficas
Mas não trazem liberdade
Há moralidades amorais

Que viagem é esta?

Esperem! Fiquem quietos
Não me digam nada
Não me venham com sermões
Não me revelem segredos
Não me expliquem nada: a lutar saberei

domingo, 2 de setembro de 2012

O mar


As ondas sucedem-se, ciclicamente, numa aparente serenidade. Os navios passam ao largo deste mar surdo e absurdo onde me afogo. Confesso: ele é o meu íntimo abismo de refúgio. Nele alcanço as iludidas bóias, ele é a praia de pedras nuas onde me sento, onde encontro caminhos de algas oscilantes que dançam ao sabor das marés, que crescem em direcção a uma superfície inexistente. Ele é a angustiante canção, de sal e silêncio, que me embala e me conduz às profundas águas de mim. Ele é o charco das palavras onde distingo o negro do branco, onde finjo conhecer aquilo que desconheço.
Ele é a minha verdade, a verdade das pequenas coisas.

sábado, 1 de setembro de 2012

Inferno a dançar


O baú continuava fechado
Ninguém o queria tocar
Estava, desde sempre, trancado
No meio de pessoas a passar
Era tido como um fardo pesado
Que, ali, se fazia estorvar
Desde os olhos do passado
No presente que faz preservar

Estava, então, o baú ignorado
Nada faziam para o dilacerar
Mas houve, hoje, um alienado
Que o abriu para analisar
E sobre um olhar espantado
Espelhou-se o inferno a dançar
Era um fogo movimento
Por corpos, calados, a falar

O batuque era como que ensaiado
Em miniaturas humanas a agitar
Por um gesto uno e coordenado
Que, flexível, era intenso a rimar
E os corpos saindo, iam para este lado
Vendo o seu tamanho aumentar
Sempre em passo leve e vincado
Que fazia aquele inferno andar

Mas só inferno existe onde há lugar
E só lugar há quando delimitado
Pelas divisões a discriminar
O impulso condenado
Que pior se irá tornar
Pelo ostracismo exagerado
Que evita, egoísta, ajudar
O réu a ser, no bem, educado

E só quando tudo se misturar
O inferno deixará de ser achado
Na diferença que o igual há-de abafar
Por antagonismo ao gesto incriminado


Um poema de Sara Guetta Serra e um nome para fixar.

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Arrumo-me!

Arrumo-me. Arrumo o meu ser na desordem de estar, de existir na irrealidade fora de mim. Vou arrumar-me no deserto incompreensível que sou, de existir apenas na realidade do sonho, de pertencer apenas a esta verdade barulhenta interna que me desperta todas as manhãs.
Vou por ação nesta ilusão. Definitivamente! Vou sentar-me, vou acalentar-me nos fins de tarde, perder-me nos ocasos, nos aranzéis de mim mesmo e esperar que os meus desertos se transformem em ruas apinhadas de gente, que os mares adquiram aromas a terra húmida, que os edifícios se pintem de azul profundo, os girassóis deixem de olhar o sol e as sombras desertem

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

I Jornadas dos Caminhos de Santiago

PROGRAMA
15:00
Inauguração da Exposição Documental
"Pelos Caminhos de Santiago"
Manuel Valdrez e Jorge Torres
15:30
I Jornadas dos Caminhos de Santiago
15:35
Abertura
Professor Carlos José Faria
Presidente da ÁGORArte
15:45
Saudação Terra Verde
Jorge Torres
15H50
“Peregrino ou Caminheiro”
Documentário Terra Verde de autoria de José Beça
Intervenções
Professora Doutora Alcina Manuela de Oliveira Martins"
"Os votos de Santiago na Idade Média: um tributo gerador de conflitos"
16H30
Dr. Manuel Araújo
"Santiago – marcas e caminhos no Porto"
17H00
Dr. Joel Cleto
“O Caminho de Santiago – lenda, sincretismo e património”
17:30
D. Celestino Lores
"Hospitalidad en el Camino de Santiago"
18H00
Apresentação da obra Ultreia! Caminho sem Bermas
de António Sá Gué
da Editora Lema d’Origem
Encerramento
Porto de Honra




domingo, 26 de agosto de 2012

O monstro

No silêncio de mim acordei o monstro. Acordei o monstro da consciência, a lucidez que incomoda, a loucura sã que me arrasta para a incompreensão de tudo, o caminho arredio dos mistérios do nada.
Agora, não me concebo de outra forma. Os dias sucedem-se-me na indiferença dos pensamentos, na mudez das memórias, na consciência inconsciente do sonho.
Gostava de o deixar, deixar de sentir o mundo e os outros como os sinto, gostava de me libertar desta faúlha que incendeia as horas monótonas da minha floresta.
Não o sei fazer. Caminho atento a tudo, repleto de medo. Vou-me refrescando nos meandros de pequenos riachos que ora secam, ora se avolumam neste cacifo que tudo guarda: emoções e memórias, dias e noites, onde se acumulam desordenadamente mágoas e alegrias do tudo e do nada.
Caminho...

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Leitores

Nunca escrevi a pensar em quem me lê. Nunca! Escrevo da forma que sei e gosto, sem pensar em públicos, sem pensar nos outros. Não é uma questão de desrespeito, com é lógico, é uma questão pessoal. São questões que não me interessam absolutamente nada. Sei que as palavras ganham asas, ou não, na mente de quem as lê. Sei que tocam mais uns que outros, o que é normal, e isso basta-me.
No entanto, hoje, confesso que sinto alguma curiosidade em conhecer o tipo de visitantes/leitores que todos os dias aportam a este canto escuro. Os números vão somando todos os dias, os novos leitores também vão aparecendo, mas poucos são aqueles que se atrevem a deixar uma mensagem. Não estou a pedir que o façam, bem pelo contrário, até prefiro que seja assim. Esta é apenas uma forma de abordar a questão seguinte. Quantos andam por aí de alma negra, tal como estes textos que por aqui vão sendo publicados? Quantos são aqueles que no seu silêncio banal também sentem o absurdo do mundo e se revêem nestas palavras?
Fica a questão.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Se pelo menos...

Se pelo menos o vento passasse, talvez pudesse escutar;
Se pelo menos o dia chegasse, talvez o medo passasse;

Se pelo menos o sono chegasse, talvez pudesse sonhar;
Se pelo menos o sonho chegasse, talvez pudesse dormir;

Se pelo menos deixasse de pensar, talvez pudesse descansar;
Se pelo menos a loucura chegasse, talvez deixasse de pensar;

Se pelo menos as palavras se calassem, talvez pudesse parar;
Se pelo menos o silêncio falasse, talvez pudesse sentir;

Se pelo menos a Noite chegasse...

domingo, 19 de agosto de 2012

Nada possuo

Nada possuo. Talvez os meus sonhos os possa considerar meus. Mas até esses tenho algumas dúvidas. Até esses são consequências, causas e efeitos, ações e reações de formas de sentir os outros e o mundo.
Nada possuo. Talvez este eriçar de pele, este arrepio provocado pelos pensamentos que me assaltam, seja meu. Não, não é meu! São abalos do comboio em que viajo.
Nada possuo. Talvez os barulhos quotidianos, que hoje me incomodam, sejam meus. Não os barulhos mas o desprezo que sinto por eles. Talvez só este insustentável peso do nada, talvez só esta absurda confissão seja verdadeiramente minha. O resto é o mundo emoldurado por falsos vidrilhos, páginas ilustradas de um livro para crianças, o resto é o universo artificial suspenso no intervalo do tempo.

sábado, 18 de agosto de 2012

Moonspell



(...)

The day now ends and all within
A greater darkness covers everything
Is there no end for such a pain
Is there no hope, no other life, no way to know?

(...)

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

O funil das palavras

Outrora gostava da noite. Nela encontrava o silêncio de que gosto e o alívio da objectividade diária. Nessas horas perscrutava-me e perscrutava o mundo. Refazia as intenções escondidas pelas palavras evitadas, tomava nota das atitudes, das causas e dos efeitos. Esse silêncio punha-me à mostra as frustrações das fragas, a alegria da inconsciência dos montes, a orgia da mentira.
Agora não preciso dela, tenho tudo isso sobre a secretária, nas milhentas palavras que todos os dias me vêm à retina. É como se a sua simbologia tivesse apenas um significado. É como se me afunilassem a mente, ou a mente as afunilasse, não sei bem. É como se convergissem para um ponto em vez de divergirem. Em vez de ampliarem campos, abrir outras portas, parecem fechar-me, levar-
-me para ideias vãs e frias. Todas têm sabor amargo e um cheiro a desilusão. Deixei de as dominar, agora são elas que me dominam. Levam-me, de onda em onda, para um mar de ignorância, de desilusão e ausências sempre incompletas.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

A queda

Hoje caí na rua. Cabisbaixo, alheado das irregularidades do passeio, no fundo a absurdar-me, caí por terra. De nada me valeram os pensamentos que habitavam em mim. Do outro lado da rua foi gargalhada geral. Com cara de pateta, de quem não conhece a outra realidade, limpei as mãos e desandei. Chorei e ri também baixinho. Não pela dor, que foi leve, pela desilusão sentida, por ter acordado inesperadamente para o mundo externo que me faz tédio.
Decididamente, prefiro este quarto escuro recôndito, este castelo de altas ameias. Nele há também quedas, e grandes, nele há cacos e barulhos que me fazem rir, que me incomodam, mas são meus, vivem pacificamente na esquina desta rua deserta, na mesma medida em que sobrevivem os vizinhos da tasca defronte. Acabam por ser tolerantes uns com os outros, suportam-se nas suas ambiguidades. Românticos e neorrealistas, surrealistas e hiperrealistas caminham lado a lado, contradizem-se em todos os minutos mas coabitam sem incomodar ninguém. São como uma roda dentada. Encaixam-se uns nos outros e acabam por dar corda ao relógio do meu tempo.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Vazio

Hoje nada registo em mim. Encarrego-me de não viver, de não possuir emoções, consegui fechar as portas deste ermitério e nada sentir. Nem ódio nem amor, nem alegria nem tristeza. Tudo me é vácuo, nada me interessa. Como consegui chegar até aqui? Não sei. Sei-me apenas deserto. Tudo se esvai no esquecimento de mim, nas memórias de nada, na infinitamente pequenez do mundo, nas algemas da liberdade. Tudo desaparece no fumo do cigarro, nas sombras de mais um dia de névoas sebastiânicas, nas nuvens cinzentas de uma espera infinita pela primavera que teima em não existir.
Nada se me revela nas coisas, nem visíveis me parecem ser. Aboli barreiras, transpus as minhas utopias na esperança de encontrar volume na minha interioridade mas tudo permace dogmaticamente vazio. Hoje, pela primeira vez, nem o vazio sinto, encarrego-me de não o sentir.
Todo o mundo está em mim e eu, miraculosamente, não o sinto.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

domingo, 12 de agosto de 2012

Julgar ideias


As horas de silêncio encharcaram-me. Inundaram-me de propósitos e contingências. Como sempre, nele refaço-me vezes sem conta, caio e levanto-me, morro e renasço sempre ao sabor das ilusões, sempre montado nas minhas dúvidas e nas verdades dos outros.
Neste labor maldito, nesta floresta de sentires, todas as horas junto os cacos de mim, em todos os minutos organizo a mala das memórias. Nela retenho as minhas aproximações, afasto as dúvidas, o tédio de ser, mas arranjo forças para seguir. Sei que subo ao cume das dunas para sair da minha alma desértica, sei que sigo no campo da minha infância e que persigo os sonhos que ficaram por resolver, sei que na mochila carrego apenas a incompreensão e o destino. Julguem-me! Quem julga sonhos submersos, quem? Quem julga ideias, quem? Deixem-me… Quero ser eu, este outro eu! Quero ser o “eu” silencioso e fúnebre, sonhador e indiferente, imperfeito e incógnito.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Transmutações


Matei-me, creio que viajei ao nada nietzscheano e regressei. Creio que regressei, ainda não sei, é tudo muito leve, talvez tudo não passe do simples despertar do bafo de vida. Talvez seja o pressentimento da transmutação e nada mais que isso. Talvez não seja mais que o sossego repousante das endorfinas libertadas (e libertadoras) depois de longos quilómetros percorridos.
Não sei!
Decididamente. Sim, há um sossego que me invade, as réplicas dos sentires são leves, de frequências baixas, tudo se vai rarefazendo nas horas que vivo sem viver. Os ruídos do dia transformaram-se em ondas melodiosas do absurdo e vi nascer em mim, cada vez de forma mais nítida: a verdade crua da existência.
Conheço a porta de saída, ou de entrada? Não se sai sem se ter entrado. Não sei onde estou, assim como também não sei se a consigo alcançar.

domingo, 5 de agosto de 2012

Revisões

Hoje é tempo de rever a matéria dada. Reler novamente o que foi dito, distanciado pelo tempo transcorrido. É tempo de me sumariar nas impressões colhidas, de me conservar nas memórias impressas. É tempo de refletir e colher alguma felicidade, função difícil, eu sei, para não dizer impossível, mas porque tal conceito existe enquanto ideia porque não saboreá-la momentaneamente. Não saborear as coisas daqui, essas não passam de ilusões temporalmente definidas que terminarão com a morte, saborear um futuro, uma ideia, uma ilusão. É tempo de agrupar todos esses sentires em mim, tentar encontrar a unidade nas múltiplas tendências que me enformam e por aqui dispersas na simbologia das palavras.
Vou-me!
Fiquem bem.

Dream Theater



(...)
Blurring lines drawn in between
What is right and what is wrong
Victims on the radar string us along

We're on to your agenda
The dead end road to nowhere
(...)

sábado, 4 de agosto de 2012

Sobram-me horas...

Não sei que sentido tem esta viagem armadilhada de horas sem fim. Será que esta massa informe está destinada a permanecer eternamente entre parêntesis, a navegar entre o passado e o futuro, entre a ideia e a razão?
Não sei! Hoje, sei que me sobram horas para encontrar a frase que nada diga, mas que se seja literariamente bela pelos múltiplos sentidos que possa ter. Sei que me sobram horas para me descobrir na futilidade do tempo, me esconder nas minhas limitações, criar-me e destruir-me em simultâneo. Sei que me sobram horas para carregar as minhas dúvidas e os fardos dos outros.
Sobram-me horas para na maranha de mim conseguir encontrar geometria no plasma do pensamento.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Fui


Hoje fui memórias de um futuro e um passado mil vezes revisitado. Fui conversas banais, sempre presentes, da tasca que sobrevive alegre e sociável em frente à janela. Fui sons vibrantes de carros que vivem apressados na rua, onde estive sem estar. Fui palavras soltas de livros que folheei aleatoriamente, e pouco mais fui...
Não me queixo, simplesmente caminho, caminho através do esquecimento de mim, caminho em espaços de separação, conscientes, da inércia subtil de ser e a nada pertencer.
Amanhã serei ou não...

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

A culpa dos livros

Os livros são os grandes culpados das infelicidades que vão pelo mundo, pelo menos das minhas, assim o considero.
Despem-nos, tiram-nos a roupa e depois riem-se de nós. Riem-se da nossa figura frágil, das nossas vergonhas, a tal ponto que nos obrigam a tapar os olhos para não as vermos. São uns pretensiosos, julgam-nos, iludem-nos, concluem, pintam-nos o mundo com cores que não existem, fazem-nos crer que aquelas são as reais e depois, apesar de não terem boca nem cordas vocais para articular um único som, apregoam-nas aos sete ventos como se fossem donos do silêncio.
Os livros são despudorados e imorais, constroem-nos e desconstroem-nos vezes sem conta e conduzem-nos a folguedos que nem passam pela alma do Diabo. Alguma vez se viu!, eles, que nem alma têm, matarem verdades que levaram séculos para se construírem.
Abaixo os livros!
São uns vilões, fazem-nos crer em deuses e descrer nos homens.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

CCR



(...)
I hear hurricanes blowing
I know the end is coming soon
I fear rivers over flowing
I hear the voice of rage and ruin
(...)

A luz do candeeiro

A alma é a coisa mais difícil de descrever. Talvez seja mais fácil para os pintores, não tenho esse dom, gostava, mas parece-me que será mais fácil captá-la nas cores da tela, agarrar um instante revelador, dar-lhe cores, formas disformes e deixar que os outros se projetem nela. Não para mim, que uso as palavras na tentativa de a materializar, que passo horas infinitas à procura de símbolos, de oximoros, de metáforas, mas tudo se me revela inapropriado e inconsequente. É tudo tão ténue... é tudo tão presente e tão ausente... é tudo tão irreal e tão incongruente...
Dói-me a incapacidade de não conseguir penetrar na luz solitária deste candeeiro onde descubro o meu muro, o tédio de não conseguir penetrar nela, de não ser capaz de descrever as emoções, minhas e só minhas, que todas as horas me surgem.
Dói-me este candeeiro oblíquo que apenas projeta sombras murmuras mas que me revelam aquilo que sou: uma sombra irreal, uma névoa, uma folha seca que oscila ao sabor das brisas diárias.

terça-feira, 31 de julho de 2012

Viagem ao Fim da Noite


Hoje a noite chega devagar. Chove um silêncio calmo, estranhamente calmo, ao regressar a mim. O silêncio é tanto que até as moscas descansam nele. Sopram brisas serenas, suaves perfumes de uma primavera estratificada por pressões que não quero mas vivo. Navego devagar, nem sons quero ouvir, deixo-me ir simplesmente, nada posso contra os deuses sapientes que, repentinamente, se revelaram em toda sua verdade eloquente. Sei onde tudo desagua.
Arrumo as prateleiras, pego na mala e viajo. Viajo ao fim da noite. Apago as luzes, agarro num livro e entro nos subúrbios de mim. Contagio-me mais uma vez pela simbologia das palavras que devoro. Leio e releio vezes sem conta, à procura de outros sentidos que não aquele que se me revela de imediato. Sinto-me doente, há uma qualquer bactéria que me contagia, que me induz neste caminho da ilusão.
Precavenho-me! Armo a ratoeira da realidade.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Despertar

Abro os olhos, acordo, deambulo pelo pensamento e, de repente, retenho a sensação que ainda estou vivo. Nem quero acreditar, aspiro fundo, retenho o ar e, incrédulo, abano a cabeça. Na fútil promessa do dia que se avizinha, consigo descobrir ondas de inspiração, abandono-me nelas e, durante longos minutos, deixo o meu dono que me segue constantemente como uma sombra. Entro na porta onde nunca tinha ousado entrar por razões que nem conhecia. Talvez, devido às insónias constantes, ao medo da vertigem, ao medo da condenação... sei lá!, tudo é enredo, tudo são razões de um sonho, e eu amo os sonhos.
Nos sonhos há razões que a razão desconhece, nos sonhos descobrimos a utópica liberdade, esbarramos com verdades que sempre estiveram à nossa frente mas cegos pela coitada da realidade, pobre em arte, não as vemos.
Os sonhos são a panaceia para a existência.
Continuo a sonhar.

Guano Apes





(...)
Open your eyes, open your mind
proud like a god don't pretend to be blind
trapped in yourself, break out instead
beat the machine that works in your head

(...)

domingo, 29 de julho de 2012

O pensamento

Desde que despertei para o abismo de existir cada vez se me torna mais escura a noite, cada vez me é mais difícil existir nas máscaras do quotidiano e muito mais concebê-las. Não choro nem rio, sobrevivo no pavor da liberdade concebida nas amarras da consciência. Apavoro-me perante a nudez do mundo que todos os dias se me revela desta forma tão assertiva e tão ponderada. Não estou irritado, longe disso, estou horrorizado pela lucidez das ideias que, hoje, me sobem à mente através destes canais labirínticos, belos e horríveis, que os deuses amavelmente nos concederam.
Nada mais preciso, ou melhor, nada mais precisamos, além de pensar. Só no pensamento nos descobrimos verdadeiramente, só com ele navegamos de fora para dentro e de dentro para fora. Só ele nos dá a verdadeira consciência de nós e, calorosamente, nos arranca, sem dó nem piedade, nacos viscerais da alma ensanguentados pelo nada.
Declaro-me recoletor de ideias. Nada mais preciso do que ir beber nas fontes das ideias e matar a fome no simbolismo das palavras.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Materialismo


Hoje destruí-me, destrui tudo aquilo que criei. Entrei no movimento atómico das coisas e não encontrei nada. No vazio do materialismo venci mundos reais ilusórios. Nesse movimento aleatório subatómico mil pedações de mim desapareceram, evaporaram-se nas chamas frias do pensamento. Agora, jazem, solenemente, em campa rasa, com lápide e epitáfio. Rasguei velhos papéis amarelados pelo tempo, apaguei preconceitos, queimei deuses, matei a morte, rasurei velhas verdades, mil folhas perenes tombaram pelos ventos da solidão. Percorri os corredores da loucura, andei nas proximidades da alienação mas proclamei-me. Andei escondido na floresta da realidade doentia mas derrubei muros por mim erguidos. Peguei em armas, fiz-me guerra mas venci-me.
Sinto medos, mas são diferentes...

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Cansaço


Sento-me na cadeira e espero que a Noite chegue. Fecho os olhos, encosto a cabeça ao travesseiro do cansaço e adormeço. Levito no mundo dos sonhos e afunila-se-me o futuro, fecham-se-me as portas do tempo. Acordo irrequieto, regresso à irrealidade desassossegante onde continuo a sonhar. Cerram-se-me as pálpebras e ordeno-lhe:
- Escuta-me, exterior de mim, maldito sejas, não quero dormir. Não preciso de intervalos. Não quero coisa nenhuma. Não estou cansado, corpo disforme sem dons de vida. Escuta-me... Quero voar e cair do alto.
Escuto-me. Canso-me. Adormeço.

Gary Moore

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Ao futuro


Raramente comemoro qualquer acontecimento passado. Essas manifestações de alegria sempre me pareceram descabidas, às vezes ridículas, fora da minha forma de estar e de sentir. Se o faço, faço-o pelas convenções sociais, não por convicção.
Prefiro comemorar o futuro. Este pequeno texto é isso mesmo, é uma comemoração do futuro. Provavelmente comemoro sonhos e ilusões, angústias sem remédio, mas prefiro assim, sinto essa fé bacoca em mim que, apesar de tudo, me alimenta e me alenta para continuar. Sinto uma aragem leve que se levanta no amanhã e faz-
-me crer que é uma brisa matinal refrescante capaz de me libertar da febre medonha do quotidiano.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

domingo, 15 de julho de 2012

Falhei...


Hoje sinto que o horror da vida é o mistério da irrealidade quotidiana. Caminho permanentemente sobre ideias, navego em filosofias vãs, acredito em sonhos, inspiro-me na simbologia das palavras mas a vida não é nada isso. A vida é real, pesa-me todos os dias, sinto-a, carrego-a.
Dói-me esta realidade de mim, a minha incompetência, dói-me esta inocência de apenas viver dentro de mim.
A alegria dos outros soa-me a falso, não consigo concebê-la. Em mim há apenas relâmpagos de gracejos e sorrisos confrangedores. Arrasto-me, eu sei, não tenho fé em mim, sei que falhei... Resta-me o vazio.

Fleetwood Mac


sábado, 14 de julho de 2012

A feira


Estes sons calmos, sem bateria para marcar o compasso, parecem ter algum efeito analgésico sobre estas páginas em branco. Devolvem-me palavras lunáticas, imersas em vazio, devolvem-me palavras que me parecem ser a última ilusão do nada.
Procuro na personalidade dos transeuntes a crença de que necessito. Apenas me encontro na indiferença. Procuro neles esta apatia de mim mas não sou capaz de a encontrar. É minha, terrificamente minha! Parece-me tudo tão distante, tudo tão irreal que não sei se durmo se sonho.
Procuro no olhar dos outros este desespero permanente que se entranhou em mim. Nada! Não encontro uma ponte que ligue esta brecha. Estou só, rodeado de gente, e este estigma sangrante do tempo que não pára. Dói-me o meu mundo e dói-me o mundo dos outros.
Deixem-me ir...

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Sem tempo


Perscruto o tempo,
Desço na deriva da evolução.
Vi Deus criar-me:
Nasci do pecado original,
Da culpa que não tenho,
Sei da minha imperfeição.

Desço mais um degrau,
Vou no tridente de Neptuno
Olho de longe Poseidon,
Não distingo diferenças,
Pegadas comuns do mesmo caminho

Luto por poder,
queimo pelo mito da verdade
e morro de vergonha.

Entro na caverna
sou recolector,
caçador,
luto pela sobrevivência,
Abismo-me com o mundo
crio deuses,
bons e maus,
pretos e brancos,
Não distingo diferenças.

Renasço antropóide
e perco a consciência.
Sou ouriço do mar,
célula,
molécula inorgânica de um
coacervado,
de um caótico mundo
instável.

Expludo,
construo o universo,
os sóis e os planetas.
Caio no vazio,
advém o nada,
a eternidade

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Há caminhos que bifurcam


Hoje a minha floresta surge-me densa, as clareiras são raras, não há luz que me ilumine. Condeno-me a mim próprio, talvez, mas tropeço demasiadas vezes em folhas ressequidas, repletas de “certezas” que não compreendo. Olho em redor à procura de Pã, dos faunos da florestas e não os encontro, desapareceram todos na minha escuridão, ou na luz do tempo, não sei bem.
Ah!... outros mundos, sinto-me inapto para os descobrir. Não há harmonia em mim, por natureza sou demasiado inquieto e conciso, não consigo. Há demasiados cataclismos que me atormentam, não possuo um espírito protector, não há salvação para mim... De pouco me valeram as horas que passei embrenhado nos livros que me deram certezas sem nada me explicarem.
Há caminhos que bifurcam.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Yes



(...)

Soon oh soon the light
Ours to shape for all time, ours the right
The sun will lead us
Our reason to be here
The sun will lead us
Our reason to be here

Roubar uma nuvem

Esta música incomoda-me. Incomoda-me não sei se pelas recordações quer me trás se por ferir o silêncio de que necessito para entrar em mim. Logo hoje que queria voar nas asas do vento e subir ao cume dos montes, ascender bem alto, ver a curvatura da terra e, no regresso, trazer uma nuvem. Roubar uma nuvem, que sempre foi o meu sonho de criança. Embrulhá-la nos sentires, dissolvê-la na angústia e saborear a doçura do algodão doce. Queria adormecer nela todos os dias da minha existência, descansar no dorso da sua maciez e deixar definitivamente esta cama de faquir cujos pregos se espetam em mim e me ferem, me algemam a esta realidade sem substância.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Sem inspiração

(...)

Foi tempo de tudo enterrar no esconso inconsciente, de os rever amargamente nas suas memórias, de os sentir apenas como quem sente uma árvore: sempre viva mas simultaneamente ausente. Foi tempo de mastigar África como quem masca uma folha de tabaco, acre mas viciante. Uma memória sempre presente nas tardes quentes e nas noites frias de um sentir cheio de incoerências mas profundamente seu e verdadeiro. África era agora um mar de grandes vagas, abissalmente profundo, um universo de serenidades desassossegantes, incompreensíveis e estranhas. Uma terra repleta de ecos de paixões arrebatadas, de sofrimento, de rostos distantes, de guerreiros e fantasmas assustadores.

(...)

domingo, 8 de julho de 2012

Não me cansa estar só

Não me cansa estar só,
gosto de me caminhar sentado.
Não preciso de pernas nem escadas,
quero percorrer-me parado.
Não quero o Sol nem a Terra,
quero o meu sonho reinventado.

Não me cansa estar só,
gosto de me retalhar isolado.
Não quero o Céu nem Inferno,
abastanças sem telhado.
Não quero o mar nem as estrelas
quero viver, como se nunca tivesse chegado.

sábado, 7 de julho de 2012

Deep Purple

Fingimentos

Às vezes, ao reler os textos anteriores, fico com a sensação que digo sem nada dizer. Reinvento-me a mim próprio nestas confidências, é como se fossem tentativas, repetidas, de descrever esta geografia interna e abstracta que em mim paira, a semelhar nevoeiro inverniço assente nos vales. É, sem dúvida, transformar a realidade a partir deste “eu” inexistente e, perante isto, hoje coloca-se-me a questão: que marcas ficam em mim? Que marcas ficam em quem as lê?
As marcas nos outros não me interessam, a pergunta é meramente retórica. As minhas sei quais são, mas também pouco importam. Transformam-me, viciam-me, elevam-se em mim e talham-me nos passos que dou. Aprendo, todos os dias, a caminhar com elas. Esculpem-me no isolamento.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Coisas


Voltaram as angústias do nada. A vagabundagem das Fúrias Tristes enveredaram novamente para este recanto. Sem pedirem autorização, regressaram às ruas e encostaram-se às esquinas desta casa rude e bafienta. Andam de quarto em quarto, atravessam os corredores, sentam-se e levantam-se... numa sequência de movimentos que a mim próprio me incomodam. Não sei o que procuram, provavelmente não encontram razões para se explicarem e, por isso mesmo, a mente, sempre irrequieta, continua, sem parar, numa sequência de pensamentos náufragos, de interrogações e interjeições indigestas. Dir-se-ia que navegam nas asas de um pensamento em movimento curvilíneo uniformemente acelerado. Acelera com a gravidade monótona de nada, desacelera, felizmente, na busca das palavras para se explicar a si próprio.
Monitorizo-o, controlo-o desta forma, ainda não encontrei outro mecanismo capaz de o agrilhoar no sótão, ou então, de o libertar num dia de vento e que o arraste para terras que fiquem para lá do sentir.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Transmutações


Toc, toc
posso entrar
pensamento tumular?
- Não! O Sol
estou a chamar.

Toc, toc
posso entrar
tempo de trovejar?
- Não! As nuvens
vou afastar.

Toc, toc
posso entrar
angústias de encapelar?
- Não! O mar
vou amainar.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Flora de brincadeiras


Saiba mais aqui.

Passos


Deixei de olhar o Céu,
o tempo voa,
esgotei as contemplações,
prefiro a clepsidra do eu.

Percorro-me nas pedras que piso,
um... dois... três... passos,
sinto-me estremecer
quando me revejo no lancil
do passeio tão inciso.

Que é feito da razão?
formigueiro vexatório,
abram-me todas as janelas,
prefiro sonhos infinitos
aos caminhos cismáticos de mim.

Ladeiras


Estarei lá,
na monotonia do existir,
no desespero do silêncio,
nas crinas do resistir.

Estarei lá,
porque eu sou nada,
não existo,
sou a sombra da memória,
o pavor do verbo incontrolado,
um som pardo e repetitivo.

Estarei lá,
onde o céu se rasga
e o futuro começa.

domingo, 1 de julho de 2012

Refúgios intrínsecos


Perdi a alma,
destrui-me no vórtice da dor,
cavalguei nas asas negras da morte
que desprezei.
Agora,
no eclipse da mim,
Dói-me o refúgio do silêncio,
as madrugadas,
que já não tenho para dar.
Dói-me o refúgio do tempo
em aguarelas,
que já não tenho para pintar.
Dói-me o refúgio dos sentidos,
feridas,
que ainda tenho para sarar.
Ó Deus misericordioso!
cortaram-me as pétalas do olhar.

Genesis


(...)

The crawlers cover the floor in the red ochre corridor.
For my second sight of people, they've more lifeblood than before.
They're moving in time to a heavy wooden door, 
Where the needles eye is winking, closing in on the poor.
The carpet crawlers heed their callers:
Weve got to get in to get out
Weve got to get in to get out
Weve got to get in to get out.

(...)

sábado, 30 de junho de 2012

Depressão

O mundo exterior confrange-me, deprime-me, aumenta essa tendência doentia que há em mim. Confrange-me o tempo, o horror da vida, a incompetência de não saber captar os momentos, confrange-me a lógica, as razões que não entendo. Atormentam-me as interpretações dos sonhos sonhados e não sonhados, a descoberta que não vou além de uma rotunda, um círculo de sentimentos em perpétuo movimento, uma pedra de calçada recalcada, inexpressiva, cega, sem gracejos nem arremedos de dança.
Angustio-me com as cinzas da existência, com as luzes diretas que ofuscam e nada deixam ver, com a verdade simbólica das palavras.
Confrange-me a verdade dos poetas, verdadeiros manifestantes sem palavras de ordem, linhas retas que atravessam a luz e as trevas, a beleza e a loucura.

sexta-feira, 29 de junho de 2012

Não há esconderijos na memória

Missionário de mim, sentado na cadeira mastigo-me, mais uma vez, mas engulo em seco. Silencio-me: a profundidade aumenta. Subtraio-
-me: caminho nas sombras das ruas, protejo-me da Luz fria do dia, rastejo como animal amaldiçoado e não encontro saída. Divido-me: não sei quem sou. Desenterro-me vezes sem conta, trituro-me em pedaços de memória, culpo-me pelo que fiz, por aquilo que deixei de fazer e só me explico nas reticências do amanhã. Somo-me: entro na metafisica das coisas crente de que existirá uma saída mas não descortino porta alguma. Caminho no túnel por mim construído e do qual não consigo sair. Valem-me os “rastejantes do tapete” que habitam em mim.

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Os rios também secam

Não te venhas sentar ao meu lado. Eu sou a múmia dos teus sonhos, o Cerberus deste poço de sonhos sem luz. Não te venhas sentar ao meu lado. Em mim tudo seca. Em mim não há rios nem fontes, apenas desertos e ribeiras de tristeza. Não te venhas sentar ao meu lado. Em mim não há ventos zefirinos, brisas suaves primaveris, em mim tudo é tumultuoso e ilusório. Não te venhas sentar ao meu lado. Em mim não há vida, apenas cansaço do tempo, do tic tac do relógio, da vingança da noite.
Não te venhas sentar ao meu lado...

Peter Gabriel


The wretched desert takes it's form,
The jackal proud and tight,
In search of you I feel my way,
Through slowest heaving night
Whatever fear invents,
I swear it make no sense
I reach out through the border fence
Come down, come talk to me

(...)

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Mais um dia

Viver é simplesmente esperar.
Esperar que a onda passe
que morbidez das horas
se dissolvam
na chuva que não vem,
no calor da tarde
que tarda em despegar.
Viver é estar
na margem errada do rio
que corre sem lhe poder tocar.
Viver é crer
que a liberdade
existe
na outra margem do estar.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Ontem


Ontem era outro. Ontem havia em mim substratos de futuro, raspas de crença, banalidades sonhadas. Outrora aconchegava-me em regularidades previsíveis, sonhos multicolores, inocências e ignorâncias felizes. O Sol erguia-se comigo, fazia o ciclo rectilineamente, a chuva não me trazia sons, o vento não me aportava memórias, e eu pensava em nada, sem medos repletos de ilusões. Outrora eu era uno e indivisível, átomo sem electrões, molécula temperamental sem culpas, reles substância real, estável e explicável.
Hoje sei que não sou nada disso, afinal não vou além de um abismo químico do pensamento. Hoje atacam-me exércitos fabulosos armados até aos dentes, infantes cobertos de lúcidas tatuagens, soturnos guerreiros fatais, enganosos pensamentos cheios de mistérios explicáveis.
Rendo-me!

domingo, 24 de junho de 2012

Nada


Velo a noite. Busco razões desta secura. Nenhuma emoção, nenhum sentimento atravessa a rua deserta. Do branco das paredes nada brota, as melodias são de outro espaço/tempo que não o de hoje, a luz do candeeiro não me aquece. Tudo me surge ermo e vácuo.
Sinto o cansaço físico aproximar-se, ardem-me os olhos, mas esta energia continua a sugar-me, a consumir-me, continua a apoderar-
-se-me das palavras, como por maldição. Esta força centrípeta continua a puxar-me para dentro e de mim nada nasce.
É o vazio, o nada, o absoluto nada.

Phil Collins



All of my life, I've been searching
For the words to say how I feel.
I'd spend my time thinking too much
And leave too little to say what I mean
I've tried to understand the best I can
All of my life.

All of my life, I've been saying sorry
For the things I know I should have done
All the things I could have said come back to me
Sometimes I wish that it had just begun
Seems I'm always that little too late
All of my life

(...)

sábado, 23 de junho de 2012

S. João


Escuto foguetes lá fora. Em mim explodem memórias de amanhã. Cultivo-as e alimento-me delas. Revisito-as neste licor que agora bebo e me aveluda o sonho de sentir.
Sinto a alegria de jardins embandeirados, de danças sensuais na televisão, e em mim nasce uma brisa de ar quente que me eleva como um balão de S. João.
Eleva-me neste erro descabido de querer captar tudo, de descrever o indescritível. Nessa insciência de mim percorro, como sempre e através deste método cientificamente meu, os meus corredores labirínticos, o alcatrão destas estradas vicinais que ainda me ligam ao mundo lá fora. Percorro-as sozinho, sei que ninguém me ensina a caminhar, sei que este caminho é solitário, docemente solitário.
Eleva-me na vã tentativa de ser dono deste percurso, senhor de mim mesmo, de encontrar a beleza na escuridão.
Eleva-me na esperança de que neste último trago se revelem sorrisos das idiossincrasias que me revestem.

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Narro-me


Explode-me a cabeça.
Narro-me porque me dizem que para aprender basta ouvir-me com atenção. Porque os livros que leio me dizem que para conhecer basta ouvir a ausência de sons. Abstrair-me, evocar o infinito e caminhar, sem medos, no meio das neblinas até chegar ao osso.
Ausências de sons tenho que me bastem, pontos de interrogação não me faltam, “ses” que redemoinham são mais que muitos, por isso narro-me. Narro-me até ficar de mente vazia, até que as palavras se esgotem, até que nada faça sentido.
Narro-me mas não sou quem me descrevo, este não existe. Este não passa de um afluente do outro, mero riacho, sem foz nem margens, que engrossa nas horas de tédio.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

O que eu mais queria


O que eu mais queria era que a inquietude da cadeira onde me sento desaparecesse, que deixasse de girar e eu, finalmente, pudesse rir de mim. Rir como um alcoólico, sem nexo, rir do absurdo, da insatisfação contida, do desconhecido. Queria entornar o copo de vinho e ser capaz de rir da minha realidade, da consciência dos outros, dos tropeções e do bom senso fingido. Ser capaz de gargalhar do pavor do outro, da falsa moralidade, das aparências disfarçadas, rir sem propósito dos remorsos adiantados de um futuro inexistente.
O que eu mais queria era não dizer nada. Contradizer-me em todas as horas, falsear-me a mim próprio e não sentir.
Queria simplesmente estar, mexer sem existir e esboçar sorrisos como a menina da tabacaria.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Pedra Papel Tesoura - Carrocel (Plano B)

Leituras

O Sol de fim de tarde entra na janela estreita que, ainda assim, possuo. Leio. Na magia das palavras abrem-se-me outros mundos. Pouco a pouco o tempo encerra-se sobre si mesmo, autofagia-se, parece deglutir a última vaga da ilusão da vida. Uma após outra, palavra após palavra, as curvas da estrada abrem-se, a paisagem alarga-se e toma contornos de irreais. As memórias diluem-se-me no sabor aveludado das horas bacantes e eu esqueço-me da minha existência.
As palavras são assim! Têm dentro delas a magia dos símbolos e levam-nos a viagens sem necessidade de portas de embarque. Embarco ao sabor do vento e o peso do abominável feixe de lenha que carrego para me aquecer nos tempos de invernia alivia-se no bulício e no sossego de viagens fingidamente reais.
Viro a página.

terça-feira, 19 de junho de 2012

Terramoto


Estou sozinho em mim. Cientificamente falando, estou em volteios intersticiais cerebrais. Geologicamente falando, estou num terramoto com epicentro no pensamento. As ondas de choque curvam-se e vejo nascer em mim montes e vales, alegrias e tristezas, que se prolongam desde o passado até ao futuro.
Pobre conhecimento este que não consegue descrever arrepios e buscas interiores sem fazer uso das sinuosidades geológicas, sem recorrer à estafada metáfora da manta de retalhos que sou e me torna incompreensível. Pobre conhecimento este que não encontra palavras poéticas capazes de explicar estas fugas de mim, estas abstrações espontâneas que me alteram o humor, que me fazem entrar noite dentro sem sono e me conduzem a sonhos sem cor, a mundos sem rios nem mares.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Voltei?


Voltei porque a dor do nada continua, voltei porque não descortino auroras, nem arremedos de madrugadas. Os sentidos continuam mortiços e a alma continua a fermentar palavras que, por vezes, libertam. Hoje creio nisso, amanhã talvez já não seja essa a verdade, amanhã talvez seja completamente diferente. Talvez! Talvez porque eu sou a antítese daquilo que me rodeia. Em mim tudo é caótico, tudo se altera em fracções de ilusão. Em mim dou como certo apenas a ausência do incerto. Apenas vejo rotinas em meu redor, sempre a mesma hora de levantar, o mesmo carreiro de carros alinhados, todos em direção ao mesmo, as mesmas árvores, as mesmas curvas... Em mim impera a carpidação existencial, medonha e confusa.
Voltei, e porque não dizê-lo, porque quero continuar a prostituir a palavras que por aqui lavro, eventualmente a alimentar voyeurismos, voltei, desta pequena quarentena, porque neste momento acredito que este impulso vital me ajudará nesta vacuidade dinâmica interna, me apagará as grandes névoas, falsas, independentes de mim, que me vêem à memória.
Voltei? Não!, nunca se volta...