terça-feira, 27 de janeiro de 2009
Desconfianças
As conversas não iam além das coisas banais e comezinhas, assentando com grande fulgor na temporada de futebol. O ambiente tornou-se soturno. Todas as palavras eram medidas e pronunciadas num tom de desconfiança, sempre a olhar por cima do ombro, sempre a ver quem estava por perto.
sexta-feira, 23 de janeiro de 2009
domingo, 18 de janeiro de 2009
Revolução...
Ah! como era tentador navegar na revolução, libertar-se das frustrações, dar morras ao ditador, apaixonar-se pela tempestade, beijar a namorada no banco de jardim e segredar-lhe amor eterno, como era contracorrente convidá-la para dançar um longo e erótico slow, dormir com ela antes do casamento. Como era arrojado cravar um cigarro, andar à chuva, homiziar-se na multidão para ver os Pink Floyd...
quarta-feira, 14 de janeiro de 2009
O chincalhão
Quando ia à terra – como dizia, quando se referia á terra onde veio ao mundo –, depois de cear, gostava de ir à taberna, jogar a sueca, beber um copo e falar com a gente da sua criação. Em boa verdade já não era na taberna que jogava à bisca, era no café central, mais moderno, com televisão e mobiliário de fórmica, que a taberna da tia Maria Augusta com aquelas duas mesas de pinho toscas onde se jogava forte e feio ao chincalhão e uns bancos corridos encostados às paredes, onde se sentavam os mirones, teimava em manter-se aberta, já não dava guarida a todos. “Quem está fora racha lenha”. Dizia algum jogador que achasse estar a ser espiado.
quinta-feira, 8 de janeiro de 2009
A Ilha
A casa era uma das doze minúsculas casas, dispostas em “U” invertido, que podiam ser apelidadas de bonecas, constituíam a “VILA ANTONIETA”, uma aldeia em miniatura, de cujo nome elegante e romântico não transparece a vida de contubérnia a que obrigava. A casa de banho comum, um cubículo encolhido com espaço apenas para uma sanita, camuflava-se como que envergonhado, no interior de um caramanchão de heras, postado a um dos quatro cantos do logradouro comum; pátio de entrada para todos os casinhotos, cortado a meio e a todo comprimento por um estendal, onde aventados andrajos drapejavam como bandeiras, quer fosse verão ou inverno, quer chovesse ou fizesse sol. As paredes, revestidas a plástico e a jornais amarelecidos pelo tempo, não passavam de tabiques grosseiros, cuja opacidade resultava apenas para o olhar.
quinta-feira, 1 de janeiro de 2009
No balneário público
O banho semanal era no “Balneário Público” que ficava no outro quarteirão. Aos domingos de manhã, antes da missa, metia toalha ao ombro, chinelos de dedo, e ala, que se faz tarde, e é preciso tirar as cotras da semana. A Dona Hermínia, a vigilante, gorda pela inacção, lá estava, embutida dentro do cubículo onde mal cabia, a espiar quem entrava, enquanto tricotava mais uma camisola para um neto, que já lhe perdeu a conta, sempre prestável, sempre pronta a ajudar. Era como se fosse um cliente habitual, já o conhecia; precisa de alguma coisa senhor José?, inquiria sempre. Não, não preciso. Respondia, já prestes a enfiar-se numa das cabines.
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