A neve da manhã ia-se dissipando quando acabou de subir ao monte. Sentia-se exangue, como sempre, o peso que carregava, a inclinação da serra, tudo isso contribuía para o cansaço que o atormentava. Antes de iniciar a subida, que fazia regular e insistentemente, acodia-lhe sempre um pensamento de desistência. Dizia para consigo mesmo que seria a última vez que faria aquela viagem estafante, que nunca mais aceitaria tamanho sacrifício mas, uma após outra, acabava por, ao longo dos anos, concluir aquele rosário de penas que carregava em todas as suas viagens. Acreditava que sabia porque condescendia. Quando chegava ao cimo, as sensibilidades sociais desapareciam e as horas pensativas que ali passava libertavam-no dos pesos que carregava. Os pensamentos em coisas insondáveis, naquele alto de si, liberta-o dos vales profundos, das promessas sempre adiadas, quebravam-lhe as grades de ferro que trazia dentro dele.