Era uma vez um rei muçulmano, o Reimoeiro, senhor do solo e sub-solo das terras de Cucamacuca. Lá do alto da serra, de uma das janelas rendilhadas do seu altaneiro alcácer, a sua única filha a quem muito amava – de elegante vestido de cassa branca e longos cabelos frisados, cingidos por um aurífero e rendilhado diadema, pousavam docemente sobre o xaile de astracã que lhe cobria os ombros –, encoberta pelas colgaduras que adornavam a janela da quadra onde dormia e coavam a luz doentia do dia, espraiava o olhar manso e húmido pelo longo vale, sua pertença. O tempo esgotava-se lentamente na clepsidra pousada sobre o escrínio tauxiado a madrepérola, e ela aliviava a dor da alma – já que para o corpo não encontrava nem anódino nem purga benfazeja capaz de a acalmar – olhava as almuinhas e as olgas verdejantes no côncavo do vale, e lá na desbanda, do lado de lá, abrigado nas fraldas da serra, enxergava o xistoso povoado afamado pela alegria dos seus habitantes de nome Superatú. Já o Reimoeiro na busca incessante da cura para as maleitas da bem-amada filha, que lhe consumiam o corpo e a alma, mandara arautos por toda a parte do reino em busca dos melhores físicos e astromantes capazes de as debelar. Mas nada! Até os áugures e nigromantes consultados predisseram desgraça.
"..."
In: Fantasmas de uma Revolução
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