Sempre ouviu dizer que para lá do Marão mandam os que para lá estão, e isso criara nele imagens de gente distante, remota, rústica, seres isolados num reino distante, quase irreal, a quem alguém chamou maravilhoso, mas que, diga-se em abono da verdade, ele nada encontrou de maravilhoso. Viu apenas serranias desabridas, corcovadas pelo peso dos anos, torradas pelo sol, viu alcantis tremebundos pelas cieirentas noites de inverneira, húmidos penhascos empedernidos pelas enregeladas geadas, viu montes golpeados, sangrados para lhe extrair os miasmas e lhe renovar o sangue. Havia nessas visões algo de enigmático, dessa aspereza brotava uma força qualquer, desconhecida, superior, que germinava da dureza branca dos seixos,
da lisura do xisto,
da dignidade das fragas,
da pureza das fontes,
do silêncio dos homens,
das giestas,
do perfume da arsã,
da viscosa esteva, do tojo, do gelado vento, ou sabe-se lá de onde, energia quase mística que transformava os torrões mais duros em fulgurantes vergéis, montes crespos em varandas escadeadas e floridos jardins. Essa força ele viu, sentiu-a porque também ele a possuía, grande como o mar que aprendeu a amar desde ganapo, uma força que transportava no peito dorido.